Desde pequeno que me extasiavam as estórias da tia Alice, de fino recorte narrativo, enunciado assertivo e precisão mnésica infalível. Recordo a atitude altiva, o perfil elegante e finamente mulheril, o sorriso malicioso e a expressão bondosa que “encumeava” uma personalidade magnânima. Precocemente enviuvada do tio Adalberto, os contos, verídicos afiançava, que desfiava em estilo jovial e com apreciável colorido emocional e beleza expressiva, mesmo quando expunham reminiscências trágicas de acontecimentos sombrios, encantavam-me e faziam-me crer na veracidade do enunciado. Só mais tarde, rapaz “espigadote” em adolescência esforçada, comecei a interrogar-me sobre a veracidade infalível das crónicas, e me ocorreu a interrogação sobre quem seria o sujeito da enunciação. Ela, o meu avô materno, seu pai, também recordado como contista infalível e sedutor, ou qualquer outra personagem de algum dos seus enredos ficcionados?! Recordo os serões de família em que se desfiavam memórias evocativas do seu amor intenso pelo pai, aparentemente frustrado pela mãe, minha avó materna de memória ambivalente para a filha e restante progenitura. Mais tarde, adulto jovem, embrenhei-me no curso de medicina, tomado por um desejo que parecia ser de um Outro… Mas, de quem? Ocorria-me o desejo de minha mãe “laborando” furtivamente no empertigado subconsciente juvenil, ademais em liça competitiva edipiana com meu pai, conscientemente a figura parental de predileção. Mais tarde ainda, adulto já um pouco amadurecido, decidi aproximar-me a um desejo egóico mais personalizado, sem nunca trair o Ideal materno. Nesse tempo mais recente, já “Nome do Pai” para um progénito rapaz, decidi tornar-me curandeiro de almas. Ora, parcialmente resolvido o “imbróglio” da minha identidade profissional, restava esclarecer o enigma da Tia Alice. Afinal que discurso seria o dela e o que quereria com ele transmitir? Não seria o discurso do universitário, menos ainda o do psicanalista…talvez o discurso da “histérica”, quem sabe?! Até pela sedução perversa que a sua palavra encantatória exercia em mim, em todos nós sobrinhos e sobrinhas que a ouvíamos tão fielmente. Foi numa sessão da minha análise pessoal que um sonho “fortuito” levantou o véu do mistério da minha dúvida antiga. Nesse sonho, Alice está enlaçada em meu pai e lança-me um olhar sedutor (pressinto-me no sonho, embora não me “veja” nele) A encenação onírica tinha por cenário o recanto da espaçosa sala de jantar em que, rapaz já mais crescidote algumas vezes sozinho e alvoroçado em vê-la contar-me as suas estórias, me acolhia ao seu regaço com prazer. Como se a linguagem do Inconsciente tivesse desvelado os “fios” da Verdade oculta de uma atração edipiana subtil finamente trazida à Realidade da minha vida adulta de sujeito de palavra. Ora, é o Psicanalista “in acto” que convosco partilha esta memória que vos convida que se juntem a mim e aos amigos psicanalistas lusos, espanhóis e sul-americanos que integram o colectivo de reflexão psicanalítica da Associação Psicanalítica Internacional (API) Lacan en IPA, no XII Lacan na IPA subordinado ao tema “Verdade, Inconsciente e Realidade” que terá lugar em Lisboa entre 8 e 10 de Junho deste ano de 2018…
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